Sorocaba, 22 de agosto
de 2013
Uma multidão de Narcisos
Narciso era um rapaz belo, imponente,
majestoso – e indiferente ao amor. Quando nasceu, seus pais, Céfiso e Liríope,
receberam a profecia de que ele só teria vida longa caso nunca visse o próprio
rosto. Muitas moças se apaixonaram por Narciso, mas ele não se interessou por
nenhuma. Tornou-se um adolescente arrogante e desdenhoso. Até o dia em que, ao
rejeitar uma ninfa, foi castigado pela deusa da justiça. Ele voltava de uma
caçada e, ávido por água, foi até o lago. Viu sua imagem refletida e ficou
enfeitiçado, encantado por si mesmo. Apaixonou-se pela própria imagem e ali
ficou até sua morte, uma vez que não conseguiu consumar esse amor. Quando
procuraram seu corpo, encontraram apenas uma flor amarela, solitária, linda e
estéril: o narciso.
Essa história da mitologia grega
é triste, sim. Mas basta olhar ao redor para perceber que ela traz uma
importante reflexão sobre fenômenos bastante atuais. A imagem que aprisiona; a
necessidade de construir e mostrar essa imagem não como ela realmente é, mas,
sim, como gostaríamos que ela fosse. Essas são questões que não param de
martelar na cabeça de quem pensa a sociedade contemporânea. Estão refletidas
nas artes plásticas, na fotografia, na literatura, na televisão. Na internet,
basta ver a infinidade de páginas de relacionamento em que os usuários fazem
questão de devassar sua intimidade e a alheia , blogs, fotologs e afins que
expõem vidas e imagens que parecem ter sido preciosamente esculpidas para
agradar.